Ano 2020: Mensagem de Natal do Arcebispo de Évora

 

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ANO 2020  - SOLENIDADE DO NATAL DO SENHOR

Mensagem do Arcebispo de Évora

Refazer a vida com a luz de Cristo

“Um Menino nasceu para nós, um filho nos foi dado” (Is 9, 5)

 
  1. Saúdo-vos com o cumprimento de S. Francisco de Assis: «Paz e Bem»!
De facto, na História da Igreja, foi este Santo de Assis que no Natal de 1223, há 797 anos, formou o primeiro presépio com figuras autónomas. Parece que com a finalidade de nos aproximar mais da verdadeira Humanidade de Jesus, o Verbo Encarnado, feito pobre com os pobres. S Francisco, trocou o local habitual da Missa do Dia Santíssimo do Natal, ou seja, em vez do espaço sagrado da Igreja, procurou uma gruta natural na floresta de Grécio, local montanhoso, nas proximidades da cidade de Assis, onde se havia construído um “Romitório”, para os frades aí digerirem no silêncio da natureza, as riquezas da Palavra de Deus, da lectio-Divina. As crónicas afirmam mesmo que o seu realismo o levou a espalhar palha pelo solo da gruta, e com a presença de um burro e de um boi, autênticos, ali colocou as figuras de Jesus, Maria e José e em profunda contemplação celebrou com os seus irmãos o Mistério da Fé. Eis-nos, convidados a celebrar a Natal deste ano 2020, a grande noite e o grande dia a que São Francisco de Assis chama a “Festa das festas”, pois foi neste mistério que se iniciaram as manifestações do Emanuel e a plenitude da beleza do Rosto Misericordioso do Pai revelado pelo Filho, com o Espírito Santo. Claro que a Arqueologia Paleocristã encontrou cenas com a representação do nascimento de Jesus, através de frescos presentes em ambientes crípticos e catacumbais já nos anos 200 e 300, são preciosidades da história iconográfica cristã, tratam-se de pinturas afrescadas, muito simples e rudimentares, porém reveladoras do apreço que os Cristãos sempre tiveram pela revelação da Luz que ilumina todos os povos e nações.  
  1. Este ano celebramos o Natal de modo radicalmente diferente, é que a pandemia que nos trouxe a obrigatoriedade do uso de máscaras, desmascarou a nossa vulnerabilidade e desnudou as falsas e supérfluas seguranças com que íamos preenchendo as nossas agendas, ocupando os nossos calendários, construindo os nossos projetos, os nossos hábitos e costumes. Deixámos, afinal, adormecer e abandonámos aquilo que nos alimenta, sustém e dá força à nossa vida, à vida da nossa família e das nossas comunidades.
No dia 27 do passado mês de março, na Praça de São Pedro, vazia pelo confinamento e sob uma chuva forte, o Papa Francisco disse-nos: «Com a tempestade, caiu a maquilhagem dos estereótipos com que mascaramos o nosso “eu” sempre preocupado com a própria imagem; e ficou a descoberto, uma vez mais, aquela pertença comum à qual não nos podemos subtrair: a pertença como irmãos». No Ano Laudato Si’ (2021), reiniciar a vida, vai exigir de nós todos, isto se não quisermos voltar a ouvir e a escutar o grito da terra e dos pobres, entrarmos num «processo fraterno de regeneração» até assumirmos a nossa corresponsabilidade fraterna com todas as criaturas. Talvez procuremos todos, ainda chão firme, para reiniciar, em segurança uma vida que foi abalada até aos seus alicerces, os seus fundamentos e a sua raiz. O Papa Francisco alerta-nos para a realidade que Viktor Frankl, ilustre membro da Escola de Neurologia de Viena e fundador da sua própria escola, a Logoterapia, nos propõe: «Quando já não somos capazes de mudar uma situação, estamos perante o desafio de nos mudarmos a nós mesmos.» Assim, Francisco desafia-nos perante este possível quadro global: «Muitas coisas devem reajustar o próprio rumo, mas antes de tudo é a humanidade que precisa de mudar. Falta a consciência de uma origem comum, de uma recíproca pertença e de um futuro partilhado por todos. Esta consciência basilar permitiria o desenvolvimento de novas convicções, atitudes e estilos de vida. Surge, assim, um grande desafio cultural, espiritual e educativo que implicará longos processos de regeneração.» (Laudato Si, n.º 202).  
  1. Neste Natal 2020, em que a nossa Arquidiocese assume o desafio de permanecermos mesmo nos momentos áridos de deserto, como Discípulos Missionários da Esperança, dando vida ao compromisso de Jesus «Vinde a Mim todos vós que andais cansados e oprimidos e Eu vos aliviarei», procurando e acolhendo os sedentos da Esperança no oásis da Alegria do Evangelho, testemunhado por uma Igreja, Mãe de coração aberto, «Peço a Deus que prepare os nossos corações para o encontro com os irmãos independentemente das diferenças de ideias, língua, cultura, religião; que unja todo o nosso ser com o óleo da sua misericórdia que cura as feridas dos erros, das incompreensões, das controvérsias; que nos envie a graça, com humildade e mansidão, pelas sendas desafiadoras mas fecundas da busca da paz». (Fratelli Tutti, n.º 254)
A Paz que só é possível, quando brota das entranhas mais profundas do coração humano, porque aí chegou a Luz de Cristo, o Natal. Então haverá Paz nos indivíduos, nas famílias, nas comunidades, nas sociedades e no mundo! Como lembramos nós os Bispos de Portugal «é necessário produzir esperança e encanto neste tempo de pandemia e tristeza, de indiferença e aspereza, com datas sem estações, com meios, mas sem canções. É necessário embalar as crianças e os velhinhos, os que trabalham, os que sofrem e os que morrem. Há tanta gente ao abandono. Mas este é o tempo de contemplar o Presépio, de viver com alegria a estação do Natal, e de acolher a surpresa de Deus, que em missão nos visita com a riqueza da pobreza (2 Cor. 8, 9). Vem, Senhor Jesus! O mundo precisa tanto da tua Paz». (Mensagem da Conferência Episcopal Portuguesa para o Natal, 15.12.2020) Ao desejar para todos os Diocesanos luminoso Natal e abençoado Ano Novo 2021, imploro para todos a Bênção de Deus, através de S. Francisco de Assis: «O Senhor te abençoe e te guarde; te mostre a Sua face e tenha misericórdia de ti! Volva para ti o Seu olhar!»  

Évora, 15 de dezembro de 2020

+ Francisco José, Arcebispo de Évora




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