Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de Évora preocupada com o despovoamento e a migração no Alentejo

O Departamento de Comunicação Social da Arquidiocese de Évora promoveu nesta quarta-feira, dia 4 de Dezembro, uma conferência de imprensa com D. Francisco José Senra Coelho, arcebispo de Évora, e com o Cónego Silvestre Marques, assistente da Comissão Justiça e Paz, na qual foi apresentado o primeiro documento produzido pela recém criada Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de Évora.

O Documento apresentado tem como título: “Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de Évora preocupada com o Despovoamento e a Migração no Alentejo”, que pode ser lido na íntegra em baixo.


Leia aqui o Documento na íntegra:

COMISSÃO JUSTIÇA E PAZ DA ARQUIDIOCESE DE ÉVORA
PREOCUPADA COM O DESPOVOAMENTO E A MIGRAÇÃO NO ALENTEJO

Sua Exa. Rev.ª Dom Francisco José Villas-Boas Senra de Faria Coelho, Arcebispo de Évora, por sua provisão de 29 de junho de 2019, nomeou a Comissão Arquidiocesana Justiça e Paz, constituída por quatro personalidades da região, sob a assistência espiritual do Cónego Silvestre Marques.

A nomeação desta comissão tem como objetivo principal assessorar e aconselhar o Arcebispo de Évora, sobre assuntos relacionados com a justiça e a paz que ocorram fundamentalmente dentro da área geográfica correspondente à arquidiocese. Neste âmbito caberão certamente as problemáticas mais graves e atuais, que a todos nos assolam, devendo ser analisadas de forma profunda e consistente.

Dando corpo ao fundamento da criação desta comissão, a mesma já reuniu por duas vezes, para refletir, entre outras coisas, sobre a problemática do despovoamento no Alentejo e ao surgimento, cada vez mais evidente, de migrantes na região. Só acompanhando de perto estes fenómenos será possível perceber o que a Igreja pode eventualmente vir a fazer no futuro.

No que ao despovoamento diz respeito, foi analisado o enquadramento sociocultural, económico, educacional, infraestrutural, político e religioso, no passado e na atualidade, tendo em vista identificar as razões pelas quais as pessoas saíram e saem da região. Neste domínio, identificou-se que no passado, o êxodo da população deveu-se sobretudo à busca de melhores salários e condições sociais, atendendo ao boom da indústria, do comércio e dos serviços nas grandes cidades situadas geograficamente no litoral do país. Paralela e cumulativamente, também se verificou um forte índice de emigração, na perspetiva de busca de uma melhor expetativa de vida e estabilidade familiar. Pelas caraterísticas patentes da sociedade vigente e nos padrões de vida atual, dificilmente a população voltará do litoral para o Alentejo, apesar das evidentes alterações de qualidade de vida que foram alcançadas nas últimas décadas na região Alentejana.

Relativamente à migração, constata-se que o Alentejo está a ser um dos seus grandes recetores, não só a nível sazonal, mas também a título permanente, sobretudo para trabalhos relacionados com a agricultura (com ênfase na fruticultura, na floricultura e na pecuária). A migração em causa é fundamentalmente proveniente do Brasil, dos países de Leste (Roménia, Moldávia, Ucrânia, etc.) e da Ásia (India, Paquistão, Nepal, etc.) em que estes últimos, além dos problemas da língua, têm um conjunto de rituais e formas de vida (mais coletivo que individual – também por razões monetárias) a que devemos estar atentos. Infelizmente, em muitos destes casos, suspeita-se a existência de tráfico de pessoas com exploração das mesmas, quer por máfias dos seus países de origem, quer pelas entidades empregadoras.

Em súmula, as caraterísticas da sociedade atual, designadamente quanto à sua forma de ser e de estar a título individual e coletivo, a realidade da nossa distribuição administrativa, a oferta que nos é proporcionada e a idiossincrasia específica vivida na região do Alentejo, são fatores julgados imutáveis que lançam desafios aos diferentes decisores de organismos/instituições do Estado no sentido de, com criatividade, pensarem em novas abordagens que permitam, em tempo, inverter o status quo da atualidade no que respeita à desertificação humana. Independentemente das políticas e dos incentivos que vierem a ser criados, dificilmente se reverterá o despovoamento que se verifica na atualidade e, as antigas e atuais gerações de cidadãos nacionais, dificilmente voltarão em massa às suas origens.

Neste contexto, resta-nos pouco mais que acolher e integrar, da melhor forma possível, os migrantes que escolhem o Alentejo para viver e trabalhar. Neste particular, a Igreja pode ser um parceiro privilegiado neste acolhimento, através dum acompanhamento próximo da realidade laboral e social, ajudando, dentro da sua esfera de influência local/regional, a uma melhor integração, principalmente através da projeção da visibilidade da sua realidade. A desmitificação de alguns tabus relacionados com outras religiões, a ajuda na aprendizagem da língua portuguesa, o apoio escolar e sanitário, o dar a conhecer os nossos costumes e rituais e o apoio ao conhecimento de direitos dos migrantes são tarefas que podem fazer a diferença na retenção de pessoas na nossa região e que o seu acolhimento seja o mais caloroso, humano e fraterno possível. Sabemos que destas questões se tem vindo a ocupar o Departamento de acção socio-caritativa da Diocese, nomeadamente, através da Cáritas. E, confiamos, que, agora em articulação com a CJP da Diocese, se irá continuar esse trabalho.

Como reflexão final deixamos o repto de, numa primeira abordagem, denunciar/expor situações anómalas e não compagináveis com os princípios e os valores da Igreja Católica e da boa convivência entre pessoas (independentemente da sua raça, género, religião), propor medidas, que venham a criar um normal e rápido processo de integração, passando necessariamente pela agilização dos procedimentos e, dentro do possível, exercer pressão junto de entidades/individualidades que tenham/possam influenciar a decisão ao mais alto nível do Estado e das instituições públicas com responsabilidades nestes domínios.

Foto: Pedro Miguel Conceição/a defesa

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